João Paulo Cotrim

Literatura Editor
© Graça Ezequiel

João Paulo Cotrim (Lisboa, 1965) criou, há quase dez anos, a abysmo, pequena editora de casos particulares. Escreve para isto e aquilo: cinema de animação, banda desenhada, ficção, ensaio, aforismos e poesia, isto além de histórias para as várias disparatadas infâncias. Dirigiu a Bedeteca de Lisboa e comissariou um sem número de exposições. Assina, no jornal Hoje Macau, a crónica semanal, «Diário de um Editor».

Sugestões

Luís Carmelo, com longo e prolixo percurso na área da ficção como do ensaio, não deixou nunca de testar as formas onde foi vertendo a lava torrencial de um estilo muito particular. As suas narrativas são esculpidas a golpes certeiros, assentes em imagens de extrema riqueza e basta cintilação poética, compondo com detalhe ambientes de espanto e armadilha para personagens em busca de si.

A cidade e a língua, nos romances de Nuno Bragança, cruzam-se de modo a construir laboratório das mais fulgurantes experiências. Não são apenas arquitectura e circunstâncias, ruas ou palavras, são memória e língua a fazer-nos acompanhar aventurosos percursos, dos mais díspares no colectivo social, e que nas páginas se encontram para definir a modernidade. Um tempo que nos interpela sempre.

Para cada romance, Paulo José Miranda, que recebeu o primeiro Prémio José Saramago, ergue como pano de fundo um tema cuja investigação ensaia ao mais ínfimo detalhe, sem perder o pé. Pode ser a criação ou a violência, a felicidade ou, como é caso do mais recente, a responsabilidade. Faz a narrativa caminhar sobre ideias fortes, mas sem apagar as vozes das personagens e mantendo a capacidade de nos surpreender. Por uma razão ou outra.

Não se deve aconselhar a leitura de Raul Brandão de ânimo leve, de tal modo nos pode afectar. «Húmus», por exemplo, marcará um antes e um depois para quem arrisque penetrar o seu enigma, descobrindo a natureza e quem a habita através da potência de uma escrita que se confunde com a vida. Seguir os seus passos literários é forma única de traçar perfil de uma paisagem e de um povo, nos vários mapas que foram inventando.

Em país tantas vezes fechado sobre si, desatento até de si, Teixeira-Gomes abre janelas sobre lugares e figuras, exóticos ou próximos. E o vento fresco que deixa entrar sopra no ritmo do seu fraseado, no olhar estético que dispensa, na agudeza com que esculpe figuras de carne e osso, no cosmopolitismo das geografias, na sensualidade dos temas. As suas cartas diletantes ainda ressoam hoje como se acabadas de enviar.

Não nos deixemos enganar pelos entusiasmos da crítica. Valério Romão não se limita a dar-nos, como poucos, acesso aos universos íntimos da doença, da dor, da perda. Toda a sua escrita se deixa atravessar pelo humor, pela subtileza de um olhar cru de tão humano, pelo tom hipnótico da frase, que usa como bisturi. O que aqui se não encontra são facilidades ou cedências à literatice, estamos no território da carne viva.